sexta-feira, agosto 04, 2006

RECANTOS DA MINHA MEMÓRIA

A rua sinuosa e estreita, varrida pelo vento e pela chuva, endemoninhados.
As casas baixas, de telha vã, caliça desmaiada onde a pedra nua espreita, são o resguardo da espera.
Da espera dos dias melhores, dos dias das sementeiras e das colheitas.
Agora, nesta invernia, acolhem os sonhos de olhar perdido nas chamas da lareira.
Vai ficando escuro. Anoitece cedo no Inverno.
"Vá! Todos para casa; direitinhos a casa" dissera a professora.
Percorro a rua sinuosa e estreita.
Não se avista vivalma.
O vento redemoinha, silva, empurra-me, e uma chuva miudinha, fria, bate-me na cara.
Sinto-me parte daquele momento, dos elementos da natureza, agreste, agreste como eu, forte como eu - "olha que te constipas!" - Qual quê! Forte como eu, ensopado até aos ossos, sem frio nem calor, mas de peito cheio de vida.
A sacola ao ombro, cheia de livro e de caderno, mais o lápis, a ardósia e a caneta-de-tinta-permanente. Para as provas.
A importância de ter 7 anos.
A importância de 'andar na escola'.

Percorro a rua deserta.
Ali a meio, a tabuleta da taberna gira nos seus gonzos e bate contra a parede ao ritmo da ventania.
Espreito.
O tecto baixo de madeira enegrecida, o chão de terra batida, os barris alinhados por detrás do balcão comprido.
Pendurada do tecto uma lanterna a petróleo, de luz amarelenta, dolente, sem brilho.
Como a alma daqueles corpos ali encostados a bebericar a aguardente da dormência, a aguardente do engano, a aguardente da esperança.
Olham-me. Como a um fenómeno deveras estranho.
"Vai para casa, rapaz, que o diabo anda à solta esta noite...".

3 comentários:

Cleopatra disse...

Mais uma vez...parece que andou por aqui o Moicano...Pois é!

xavier ieri disse...

?!?

xavier ieri disse...

?!?