quarta-feira, novembro 30, 2005

PONTOS NOS ii

Esta é uma espécie de carta aberta ao povo português e aos senhores políticos deste país.

Portugal necessita de, urgentemente, recolocar a justiça nos carris do seu escopo constitucional: Administrar a justiça em nome do povo.

O que, no contexto do estado actual da justiça portuguesa, significa justiça em tempo útil, sem o que já justiça não é.

Como tem vindo a ser repetido, inclusivé por responsáveis políticos, do bom funcionamento da justiça depende o desenvolvimento do país.

A justiça em Portugal, passe o simplismo, é um binómio com dois braços:
- Por um lado, o conjunto das pessoas que directamente produzem actos tendentes à obtenção de uma decisão judicial; de entre estes, os juízes são aqueles que têm a competência e a responsabilidade de administrar a justiça, ou seja, de produzir decisões jurisdicionais.
-Por outro, a Assembleia da República e o Governo. São ambos detentores do poder legislativo (na forma mitigada da repartição de poderes na nossa democracia) e o Governo detentor do poder executivo.

Significa isto que aos juízes cabe apenas a, aliás nobre, exigente e exclusiva, tarefa de julgar.

E, nesta matéria, ainda não vi qualquer estudo ou sequer factos que permitam concluir que o estado da justiça se deva à falta de trabalho dos juízes portugueses (ou dos operadores judiciários).

E, passe o infeliz (que não inocente) episódio do Primeiro-Ministro sobre as férias judiciais, demonstrativo da sua ignorância sobre a matéria, nem o poder político a tanto se atreveu.

Sem favor. Simplesmente sabe que, de facto, na justiça se trabalha e muito. É, de resto, a única forma de tentar ultrapassar aquilo que são as deficiências do sistema: Mais e mais horas de trabalho.

É bem conhecido o facto de os juízes trabalharem, em regra, para além e muito para além de um horário de trabalho normal público ou privado.

Mas é tudo o que os juízes (e também os operadores judiciários) podem fazer: Trabalhar e trabalhar e trabalhar com vista à resolução dos conflitos que lhes são submetidos para julgamento.

Tudo o mais depende da Assembleia da República e do Governo.

Todos os meios materiais, técnicos e humanos dependem do Governo, pelos seus diversos serviços.

Mas isso não esgota a responsabilidade do poder político pela situação, boa ou má, da justiça.

São também a Assembleia da República e o Governo, cada um no uso das suas competências próprias ou partilhadas, quem aprova as leis que regem a justiça, as leis de processo, de apoio judiciário, de formação dos magistrados, estatutárias, etc.

Como também são os responsáveis pela criação de regimes substantivos que, não raro, pela más soluções legais que implementam, são verdadeiras e grandes fontes de contencioso.

Como também são eles que importam de outros ordenamentos jurídicos, institutos jurídicos "novos" e entre nós implementados, não raro e até frequentemente, de forma deficiente;

Como também a própria transposição para a ordem jurídica portugesa do direito comunitário é, por vezes, deficiente.

Deficiências essas que são também fonte de contencioso que, inevitavelmente, chega aos tribunais.

Numa palavra, o modelo da justiça portuguesa é algo que resulta de diplomas legais aprovados pelos órgãos de soberania Assembleia da República e Governo, o que significa que não só os juízes nada podem fazer, nessa matéria, afastada que está das suas competências, como apenas lhes resta (aos juízes) aplicar a lei vigente, boa ou má.

Mas há mais.

Os juízes, como também os magistrados do Ministério Público, como também os funcionários judiciais, como também os advogados, têm sistematicamente apontado as falhas do sistema.

Como têm também mostrado e enfatizado a disponibilidade para cooperar na identificação mais precisa e estudo dos respectivos problemas.

Como têm também apresentado propostas de solução.

Como têm também mostrado toda a disponibilidade para colaborar na elaboração de soluções que sirvam a justiça e a recoloquem nos carris de uma justiça que se quer pronta e eficaz.

E o que tem feito o poder político?

Nada!

N-A-D-A!

Isso porque, entre aquilo que fez e nada a diferença é coisa nenhuma!

Tudo continua na mesma!

De uma vez por todas, é preciso que se saiba que, sem alijar as responsabilidades que eventualmente caibam (e algumas caberão, pontualmente) aos magistrados, aos funcionários, aos advogados, é o poder político, e mais a sua inabilidade e mais a sua incapacidade e mais a sua incompetência, o grande responsável pelo estado actual da justiça em Portugal.

E que bom que era que essas fragilidades (passe o eufemismo) desembocassem apenas em problemas para a justiça.

Infelizmente, a conclusão a que se chega é a de que, numa parte que se afigura apreciável, o país está de rastos devido à actuação política, ou melhor, devido à condução que os senhores políticos, quer da administração central, quer da administração regional, quer da administração local, fizeram ao longo dos anos, sem rumo, sem destino e com muita corrupção pelo meio.

Aos deputados e governantes deste país pede-se apenas que cumpram o seu dever assumido perante os cidadãos, guiados pelo interesse público.

E que o interesse público não seja uma bandeira de pura demagogia agitada vezes sem conta para ocultar sabe-se lá o quê, como o tem feito o Governo.

Toda a gente sabe que a verdade é um bem raro no discurso político.

Em política, o que hoje se diz amanhã desdiz-se; o que hoje é verdade amanhã é mentira; o que hoje se promete amanhã não se cumpre.

Mas, senhores políticos: Façam lá o vosso joguinho politiqueiro; empanturrem-se de demagogia; favoreçam lá as vossas clientelas (todos nós, portugueses sem tacho, cá estamos para pagar a factura); mintam até os narizes sairem pelas escadarias de s. Bento, enfim...

Mas, por favor, em nome do povo que (des) governam, pelo menos em relação a pontos-chave da vida nacional, como é o caso da justiça mas não só, não descurem a governação; a boa governação, entenda-se, em prol do interesse público, com postura e sentido de estado. Com elevação e honradez.

Os juízes cá estão, como sempre estiveram e hão-de estar, para, de harmonia com a lei, dia a dia, em cada tribunal, trabalharem em prol de uma justiça em tempo útil, administrando a justiça em nome do povo.

terça-feira, novembro 29, 2005

E SE É MESMO PURA INCOMPETÊNCIA?

Reunidos os juízes e expostas as suas razões para o descontentamento e para o repúdio de posturas governamentais impróprias de governantes num país democrático e num estado de direito, lançados desafios de diálogo, apontados caminhos de solução e propostas de mudança, reafirmados o empenhamento e a disponibilidade, engajados os juízes na sua única e exclusiva forma de vida profissional (qual sacerdócio!), eis que continua o desnorte do Governo relativamente à Justiça, como as suas imediatas reacções tão bem espelham.

Não mostram postura nem discurso de Estado.

Os dois principais responsáveis pela política no campo da Justiça, o PM e o MJ, das duas uma: Ou nem sabem verdadeiramente do que falam ou então seguem um plano muito bem concebido, aqui já de tipo maquiavélico, porque estruturado e planificado no médio e longo prazo e com objectivos definidos mas desconhecidos de todos.

E todavia... parece que a "coisa" é bem mais tola.

Por vezes, procuram-se motivações numa estratosfera intelectual, onde julga situar-se o plano do pensamento, no caso, dos responsáveis governamentais.

Essa é uma atitude que revela um certo crédito que ainda é concedido ao Governo (designadamente ao PM e MJ), a partir da idéia, apriorística e abstracta, de que aquelas pessoas terão mérito, competência e competências, e boas intenções.

Mas a explicação pode ser bem mais linear: pura incompetência.

E, claro: Má formação pessoal.

Nesse plano, bem se compreende que as pessoas que integram o Governo confundam legitimidade eleitoral com manipulação grosseira da opinião pública, deixando, pelo caminho, de rastos, um fundamental pilar do país: a justiça.

Não só as medidas até agora tomadas se revelam insipientes ou mesmo contraproducentes, como também a omissão de medidas, que só ao Governo e à Assembleia da República compete tomar, tem agravado e mostram potencial para agravar o já degradado estado a que a justiça chegou.

Ao Governo e à Assembleia da República cabe o papel de legislar sobre a matéria, extensa e complexa.

Cabe-lhes interpretar os sinais da vida do país e verificar que o actual modelo judiciário e processual está obsoleto, face às exigências actuais, e a carecer urgentemente de intervenção estrutural.

Mas, é bem de ver que um governo, encabeçado por um primeiro-ministro que, no seu discurso inaugural, face a um país com tremendos problemas para resolver e a carecer de linhas de rumo decisivas e fortes, apontou apenas as "férias judiciais" e a "venda de medicamentos fora das farmácias" como os elementos preponderantes da sua actuação futura, está bem de ver, repito, que um tal governo nunca poderia fazer mais do que aquilo que está a fazer:

_ A destruir a harmonia entre os cidadãos;

-A denegrir a imagem dos pilares fundamentais do país e da democracia, apresentando os seus titulares como seres abjectamente privilegiados (desde a justiça, à educação passando pela saúde);

- A desbaratar o capital social do país em guerras intestinas e absolutamente inúteis;

É atroz e revoltante, verificar, mais uma vez para quem não queria ver, que este PM e este MJ, no que toca à justiça, não sabem do que falam.

Julgam identificar um problema e logo acorrem com uma suposta solução, que não passa de remendo branco sobre pano preto, nem sequer cosido mas apenas alinhavado.

Ó senhor Ministro da Justiça: Faça um favor ao país e demita-se.

É que, é preferível nada fazer do que fazer o que tem vindo a fazer: a destruir tudo aquilo em que toca.

E se a sua consciência for renitente (ou se ela estiver obnubilada por um ego demasiado narcísico) ao menos siga o conselho da nossa querida Amália e vá pelo "mais ou menos", ou seja, finja: "vale mais o mais ou menos do que mais, porque menos não pode ser".

Vai ver que num instante, para si, passa o tempo e não tarda está livre de tudo isto.

Sim, porque do que não há dúvida é de que "este não é o seu ministério"!

segunda-feira, novembro 28, 2005

QUEM APAGOU A LUZ*

Já percebi que nisto dos blogs o silêncio tem múltiplas potenciais explicações.

Significa isso que para dizer "não tenho nada para dizer ou acrescentar" é preciso dizê-lo de "viva voz".

O silêncio aqui é apenas isso: Como que em consequência de um murro no estômago, sinto falta de ar.

E sinto também que falta dizer algo.

Acima de tudo, falta FAZER algo.

Já não basta cada um, no seu cubículo, fazer o melhor que pode e sabe pelo seu país.

Sufoco!

Talvez seja apenas a sensação de que nada depende de mim; nada depende de nós.

Pelo contrário, estamos completamente nas mãos dos arrivistas políticos, à mercê de lógicas que não parece passarem pelo interesse do país, dos cidadãos.

Não acredito que indivíduos no exercício das funções de ministro sejam ceguetas ou incompetentes; Não com o burilado demagógico que as pessoas que actualmente exercem o cargo de ministro e de primeiro-ministro demonstram.

Não pode ser incompetência: É um propósito.

Qual, não sei.

Esta estranha situação na e da justiça (para mais não dizer), que não está nas mãos de cada um de nós resolver, deixa-me capaz do melhor e do pior.

Opto pelo melhor (?): Vou continuar a trabalhar o melhor que posso e sei.

Para os amargos de boca, bebo uma agüinha das pedras.

Lamento a escuridão institucional.

Ou, como perguntava a *Sónia : "quem apagou a luz?".

quinta-feira, novembro 17, 2005

UM DIA NORMAL

Processos, processos, processos!
Despachos, despachos, despachos!
Julgamento, julgamentos, testemunhas, requerimentos, despachos, despachos...
Sentenças, sentenças, sentenças....
Estatística, pendências, urgências...
Providências, urgências, urgências...

(Não me posso esquecer de viver)
Post it: "não esquecer de respirar";
Post it: "não esquecer voltar para casa antes que o galo cante";
Post it: "Não esquecer de verificar se o mundo ainda existe";

"Exmº Senhor Dr. Juiz"
Pois!
Processo virtual: abre! abre! ABRE!!!
F#*»-§+, esta merda não abre!
Irra!!
O que?
20 minutos para depositar um simples despacho!!???
... o choque tecnológico...
Urgência...
Sr. dr. juiz, estão a aguardar...
despacho: Pelo exposto, julga-se...
Como se chama?
"É uma violência o que se passa nos tribunais portugueses..."
Pois...
É violento, é.
Mais lento do que vi-o, mas é...
Eu também vi-o lento.
É pedófilo?
Credo!
Vi-o. Lento.
A mim?
Não, ao processo!
...
Ó sr. dr. juiz, sinto-me indignado...
Eu também, eu também...

(!)

(Prostração)

(Mijando de pé, como mandam as regras da masculinidade, pergunto-me, no remanso da possível casa-de-banho das instalações do órgão de soberania, como é possível conseguir ainda mijar!
E de pé!
Sinto-me um verdadeiro felizardo, à beira de outros que ainda mijam, mas de gatas).

Quantos são? Quantos são?

É entrar!
É ENTRAR!

Venham ao circo juridiciário!
Trapezistas e contorcionistas de alto gabarito!
Animais amestrados vestidos de preto!
Teatro de marionetas: O inimaginável tornado real!
E Palhaços!
Muitos palhaços!
Venham! Venham! É de morrer a rir!

TRRRIIIIIIIMMMMMM...

Estou?
Sr. dr. juiz, é o sr. ministro da justiça. Posso passar?
Passe.
Estou?
Boa tarde. Fala o ministro da justiça. É o sr. dr. juiz fulano de tal do tribunal de tal parte?
Sou, faça o favor de dizer sr. ministro.
É para lhe agradecer, sr. juiz. Aliás, tenho estado toda a tarde a agradecer a cada um dos juizes portugeses.
(!).
Estou?
Sim, sim.
Pois, como lhe dizia, quero agradecer... Sabe? Talvez com uma metáfora se perceba melhor:
'tá a ver as corridas de toiros?
Pois é. Quando o toiro marra a sério, inopinadamente e de forma certeira, causa mossa! Enfim, são toiros inconformados com o seu destino medíocre de levar com umas farpas no lombo. Nesse caso, diz-se, na gíria taurina, que o toiro é "manso".
E quando o toiro marra de baixo para cima, de forma previsível e ritmada, permitindo a suprema ignomínia, perdão, galhardia de o tombar de joelhos, curiosamente diz-se que o toiro é "bravo".
Vai daí pensei que...
(!)
Pois... Desculpe. Na verdade a metáfora, embora apropriada, não é lá muito elegante.
Mas percebeu, não percebeu?
Obrigadinho, sr. dr. bravo, perdão, sr. dr. juiz.
Boa tarde.
Boa tarde.

(!)

Ora, anúncios, anúncios...

Cá está: Dr. Salvador da Cuca, psiquiatra.

TRRRRIIIIIIMMMMMMM...

terça-feira, novembro 15, 2005

MANUAL DE SOBREVIVÊNCIA

Subitamente ouço o silêncio.
Um por um, todos os animais da quinta se vão calando.
Outros vão calando.
Pura premonição.
Como se adivinhassem uma catástrofe.
Como se fosse iminente furacão ou talvez terramoto.
Aguarda-se apenas que o meteorologista de serviço lance o aviso de catástrofe.
Entretanto, impõe-se reservar umas conservas, biscoitos secos e garrafões de água.
Não se sabe, nem é possível calcular, a dimensão da devastação.
E umas pilhas.
Para o transistor.
Alguma ligação ao mundo terá de haver.

Mas quero crer (ou não fosse este um país corrupto e chico-espertista) que subornando o meteorologista se pode convencê-lo a evitar a catástrofe.
E uma vez que a razão vai sendo cada vez mais um bem raro, logo, precioso, pode até ser ser que sirva de moeda de troca.
Pede-se, pois, às adequadas estruturas representativas dos animais da quinta que reunam as suas reservas de razão e delas façam entrega ao meteorologista de serviço a troco de nada que não seja simples utilização da dita.
Poderá resultar.
A menos que esse meteorologista esteja já provido de uma razão que a própria razão desconheça.
Nesse caso, é catástrofe certa.
É que o pior que pode acontecer num país é um meteorologista de serviço desprovido de razão.
Pode ocorrer uma devastação total.

Voltemos aos biscoitos secos...

quinta-feira, novembro 10, 2005

A PORTA DA RUA É A SERVENTIA DA CASA


Da Revista Focus, via verbo jurídico:

"Há dez anos, quando foi ministro do interior, demitiu-se, com a consciência roída por uma carga sobre trabalhadores.
Agora, já sem complexos de esquerda: comprou guerras com juízes, magistrados e outros.
Só faltavam os advogados: Foi esta semana.
Resta-lhe seguir o caminho que bem conhece, por indecente e má figura..."

Pois é.

Poder-se-ia dizer que o Estado, empobrecido (atendendo ao equilíbrio para que o Orçamento tende, quem terá enriquecido sem causa legítima?), não permite ao Governo fazer melhor.

Poder-se-ia até concluir que, de entre todas as medidas necessárias, as implementadas deveriam aceitar-se e deve-se saber esperar pelas restantes (que ninguém, todavia, sabe quais são...).

Pode justificar-se tudo isso.

Não pode é admitir-se nem aceitar-se um ministro arrogante, ofensivo nas palavras e até nas acções, que desbarata estupidamente e descarta e rejeita o maior capital (no caso, na área da justiça) que portugal tem: O humano.

Como em todas as profissões e actividades, o caminho da incompetência é só um: RUA!

quarta-feira, novembro 09, 2005

O ESTADO DE DIREITO



Durante grande parte da história da humanidade, governante e lei foram sinónimos — a lei era simplesmente a vontade do governante.

Um primeiro passo para se afastar dessa tirania foi o conceito de governar segundo a lei, incluindo a idéia de que até o governante está abaixo da lei e deve governar através dos meios legais.

As democracias foram mais longe criando o Estado de Direito.

Embora nenhuma sociedade ou sistema de governo esteja livre de problemas, o Estado de Direito protege os direitos fundamentais, políticos, sociais e econômicos e nos lembra que a tirania e a ilegalidade não são as únicas alternativas.

  • Estado de Direito significa que nenhum indivíduo, presidente ou cidadão comum, está acima da lei. Os governos democráticos exercem a autoridade por meio da lei e estão eles próprios sujeitos aos constrangimentos impostos pela lei.
  • As leis devem expressar a vontade do povo, não os caprichos de reis, ditadores, militares, líderes religiosos ou partidos políticos auto-nomeados.
  • Os cidadãos nas democracias estão dispostos a obedecer às leis da sua sociedade, então, porque estas são as suas próprias regras e regulamentos. A justiça é melhor alcançada quando as leis são criadas pelas próprias pessoas que devem obedecê-las.
  • No Estado de Direito, um sistema de tribunais fortes e independentes deve ter o poder e a autoridade, os recursos e o prestígio para responsabilizar membros do governo e altos funcionários perante as leis e os regulamentos da nação.
  • Por esta razão, os juízes devem ter uma formação sólida, ser profissionais, independentes e imparciais. Para cumprirem o papel necessário no sistema legal e no político, os juízes devem estar empenhados nos princípios da democracia.
  • As leis da democracia podem ter muitas origens: constituições escritas; estatutos e regulamentos; ensinamentos religiosos e étnicos e tradições e práticas culturais. Independentemente da origem, a lei deve preservar certas cláusulas para proteger os direitos e liberdades dos cidadãos:
    - No âmbito do requisito de proteção igual pela lei, a lei não pode ser aplicável unicamente a um indivíduo ou grupo.
    - Os cidadãos devem estar protegidos da prisão arbitrária, da busca sem razão em suas casas ou da apreensão de seus bens pessoais.
    - Os cidadãos acusados de crime têm direito a um julgamento rápido e público, bem como à oportunidade de confrontar e questionar seus acusadores. Se forem condenados, não podem ser sujeitos a castigo cruel ou excepcional.
    - Os cidadãos não podem ser forçados a testemunhar contra si mesmos. Este princípio protege os cidadãos da coerção, do abuso ou da tortura e reduz enormemente a tentação da polícia de empregar tais medidas.

segunda-feira, novembro 07, 2005

O DESGOVERNO NA PASTA DA JUSTIÇA

Tudo começou num discurso inaugural, o discurso à nação do novo Primeiro-Ministro.
Logo ali eu desconfiei.
Fazia sentido, num discurso de início de mandato, elevar as férias judiciais (de entre todos os problemas da justiça, bem mais prementes) à condição de essência política para a justiça (aliás, o mesmo se diga em relação aos medicamentos)?
Na altura pensei: "Certamente que não consigo ver o alcance, mas por meu defeito, exactamente como acontece com certos quadros da nova arte plástica que eu não entendo mas sobre os quais críticos insuspeitos lavram críticas de excelência, vendo sublimes planificações pictóricas reflectindo os modernos problemas da estruturação quântica onde eu só vejo tinta esborratada".
E calei-me, remoendo a ignorância espectante.
Depois, foram saindo as imbecilidades de todos conhecidas, atacando-se os magistrados, os funcionários e agora, os próprios advogados.
Os problemas na e da justiça são sobejamente conhecidos e vão desde a formação e a falta de formação de magistrados e funcionários até à falta ou insuficiência de meios técnicos e humanos, passando, em muito larga medida, por legislação processual anquilosada e ausência de efectivos meios alternativos para a resolução de conflitos (passe a enumeração redutora).
É evidente, isto é, será evidente, isto é, queira Deus que seja evidente que o PM e o Ministro da Justiça, pelo menos, tenham consciência de que aqueles são os problemas.
Poderia até acontecer que nem todos pudessem ser, desde logo, resolvidos ( a crise financeira parecia ser séria - se bem que parece já não ser, pois havendo crise não se percebe a opção Ota dos biliões).
Mas, admitindo que por motivo de crise, nem todas as soluções que se impõe sejam tomadas para a justiça o pudessem ser, certamente que subsistiria a necessidade de implementar umas quantas e explicar a ausência das restantes.
Isto num país normal, com políticos normais.
Agora, ao invés de discurso sério e medidas adequadas e adequadamente implementadas, como se compreende esta aparente necessidade de conflito permanente com magistrados, com advogados, com funcionários?
Ainda por cima, conflitos que poderiam até anunciar montanhas mas não o fazem!
Aliás, fosse para anunciar montanhas e até se minimizava, pela eventual necessidade, as investidas do Governo contra as pessoas, investidas essas que se têm revelado aleivosas e gratuitas.
Acontece que essas "montanhas" pariram apenas ratos. E de esgoto.
Houvesse alguma utilidade nessas anémicas medidas e até valeria o esforço, sem, contudo, valer a ofensa (e essa é e continua a ser grave).
Mas não é assim.
Parece é que a cartilha política do Ministro da Justiça e deste Governo apenas tem uma via: a do conflito. A da afronta. A do linchamento público das instituições do país.

Mas com que finalidade?
Será apenas inabilidade?

Será incompetência?
Se não é, então o que é?
Quais os objectivos destas campanhas contra as pessoas, contra as intituições e contra o prestígio de instituições e de pessoas que também carecem do seu prestígio profissional como referência social de aceitação e credibilização?

Onde estão os políticos sérios, com nobreza de carácter e visão e postura de estado?

sábado, novembro 05, 2005

O ESTÚPIDO LEGISLADOR

Há uns anos, chegou-se à conclusão que se impunha uma mudança na jurisdição administrativa portuguesa.
Mãos-à-obra e a obra foi dada à luz: Pariu-se um novo contencioso administrativo.

Mas como a jurisdição administrativa não tinha juízes próprios (recrutava-os nos tribunais judiciais ao preço de juiz de círculo e de promessas concretizadas de rápida ascensão na carreira), entendeu fazer recrutamento próprio.

Para isso, entendeu também lançar a rede a profissionais especialistas em direito público.
Não um qualquer recém-licenciado inexperiente.
Exigiu, pelo menos, cinco anos de COMPROVADA experiência em direito público.
Examinou-os e tornou a examiná-los.
Por via daquelas especiais e comprovadas competências, a formação pôde ser reduzida a um ano (ao invés dos 3 anos do costume).
De entre mestres em direito, pós-graduados, quadros experientes da Administração Pública, Advogados com tarimba, cerca de 1200 responderam à chamada para, no final, ficarem apurados 84 deles.

84 verdadeiros idiotas crédulos.

Chamados a implementar um NOVO contencioso administrativo (hoje, especialistas únicos nesta matéria no seio da jurisdição, únicos com formação específica).

De seguida, tratados como se tivessem acabado de sair dos bancos da escola.

Apanhados a meio da sua vida pessoal e profissional numa ratoeira traiçoeira.

Tratados como carne para canhão.

Tendo-lhes sido imposto trabalho segundo princípios de escravidão (para quem solicitar eu explico, mas basta ler o que sobre a matéria já escrevi neste blog).

Ameaçados, em discursos paranóicos, por várias vezes, por aqueles que, sem visão nem rasgo de inteligência sobre a matéria, são meros agentes autoritários e despóticos.

Sem possibilidade de exercerem outra actividade profissional e assim, pelo menos, manterem o nível de vida que tinham anteriormente, passam pelas ruas da amargura, mês após mês.

É que ninguém esperava que o legislador, além de estúpido, fosse mentiroso e burlão.

E assim se mantêm mais de oito dezenas de juízes espartilhados no seu direito constitucional de procura da felicidade, vendo diminuídas a sua qualidade de vida e a dos seus filhos e de quem de si depende.

Não por falta de trabalho, não por falta de esforço e até redobrado.

Mas apenas porque um legislador estúpido, mesquinho, pequenino, menor, apoiado por mentalidades tacanhas, decidiu sair do buraco onde estava escondido e fazer uma alarve xico-espertice: Obter mão-de-obra qualificada ao preço da uva mijona.

A jurisdição administrativa e a tributária estão e vão a pique.

Para o fundo.

Por todos os outros motivos, mais esse.

Irremediavelmente.

Pode ser até que, pelo meio, a Administração Pública paralise.

Está mais do que visto que só pela via da revolução, da quebra, da descontinuidade, do solavanco, do quebrar das grilhetas, é que tudo isto avança: aqui como na justiça em geral.

quinta-feira, novembro 03, 2005

THE DAY AFTER

A greve.
Em termos de adesão foi quase total.

A maioria das pessoas, na esteira da declaração da ASJP, pensa que a greve foi motivada pelas questões relativas aos ditos "privilégios".

Não é verdade.

Verdade é que isso foi a mola impulsionadora.
Verdade é que isso também motivou o aviso de greve.

Mas o que motivou cada juiz a fazer greve está muito para além disso.
Por vezes é quase indizível, outras consubstancia-se num conjunto de reivindicações atinentes às condições reclamadas para o bom exercício da judicatura.

Pela minha parte fiz greve por não me conformar em continuar diariamente a enfrentar os milhentos obstáculos que me impedem de produzir, que me impedem de exercer a judicatura com dignidade, que me impedem a obtenção de resultados atinentes a uma justiça pronta e eficaz.


Fiz greve porque essa situação obriga-me a trabalhos redrobrados e suplementares e, ainda assim, sem os resultados desejáveis.

Fiz greve porque toda essa situação não me permite o pleno gozo da vida enquanto pessoa, enquanto cidadão, o gozo dos momentos em família, ao fim do dia, de cada dia, como qualquer ser humano e cidadão tem direito.

Fiz greve por indignação.

Ninguém esperava que, na sequência da greve, algo acontecesse, ou o Governo tomasse as medidas que se impõe tomar.

Teve o mérito (talvez o único) de reafirmar a impossibilidade de continuação do status quo judiciário no actual momento.

Ou se reforma a justiça, verdadeiramente, ou Portugal não avançará, pois que sem justiça operante, funcional, eficaz, nenhum país progride.

Aguarda-se actuação de quem pode para fazer o que deve.